(Shiro & Kuro)

domingo, 1 de maio de 2011

# 20

Quando, na manhã seguinte, Kuro acordou, tudo era névoa; na sua memória, espectros, feitos de sombras, pediam por favores e anéis de prata escapavam-se por entre os dedos, ressaltando na calçada.
O anel. Kuro procurou mas não estava no seu dedo.
Semicerrou os olhos. Doía-lhe a cabeça. E o corpo. Todo. Terrivelmente.
Sentia um pulsar quente no seu braço. Seguiu-o e descobriu o tubo fino e transparente por onde o soro corria. De seguida, tentou levantar-se, mas as pernas não obedeceram, apesar de Kuro se sentir com energia.
Instável e ácido, o estômago contorcia-se ao de leve. Na boca, um sabor a azedo.
“Frades de sapo”, murmuraram-lhe as paredes pálidas.
“Frades de sapo”, repetiu o metal frio, reflectindo as palavras, sabiamente.
Não estava só. O corredor estreito quase desaparecia, afogado pelas macas encostadas a ambas as paredes. A Kuro, aquele curto espaço de tempo passado no hospital assemelhou-se a uma pequena amostra do que seria o purgatório. Havia a dor em diversos graus, mais as suas vozes. E uma espera, que parecia não ter fim, em cada rosto e em cada gesto.
Só fugiu depois da enfermeira lhe retirar a pequena torneira, a que se incrustava na sua veia, com nome estranho.

Sem comentários:

Enviar um comentário

sonhos atirados