A neblina caiu, rápida e sem aviso e uma película de humidade fria cobriu o mundo, transfigurando-o à sua passagem.
A luz quente dos poucos candeeiros de rua filtrava-se de maneira surreal, de selva refractada, por entre as folhas das árvores, e criava espectros dourados à sua volta, e as sombras espreitavam, indistintas, ao longe.
Kuro continuava a forçar a fechadura, cerrando os dentes com o frio. Já sentia as pontas dos dedos enregelados e mais rígidos, e doía-lhe mexê-los, tremente, mas recusava-se a desistir.
A noite há muito que recolhera as pessoas a suas casas e que trouxera os gatos e todas as outras criaturas nocturnas e vadias para as ruas.
O nevoeiro adensava-se. A porta não abria e Kuro não percebia porquê.
Tornou a girar o pequeno ferro dentro da fechadura, mas a biblioteca permanecia cerrada.
Kuro lamentou não ter nada comestível dentro dos seus bolsos enquanto a sua barriga lhe rosnava em sofrimento.
«Será melhor retroceder e voltar numa outra noite, talvez? Não. Depois de arranjar alimento, daqui a pouco.»
«Eu volto», prometeu Kuro à porta teimosa, em pensamento.
As brumas não deixavam ver muito para além de um metro de distância, obrigando a que se descobrisse o caminho, passo a passo. Kuro não havia andado mais que oito metros quando uma das brumas lhe barrou o caminho, impedindo-a de avançar.
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sonhos atirados